Trabalho no prelo: a aparecer publicado na revista Trabalhos em Lingüística Aplicada, IEL/UNICAMP, número 38.

 

A construção social do gênero resenha acadêmica*

 

Désirée Motta-Roth

Universidade Federal de Santa Maria

 

*Trabalho realizado com o auxílio de Bolsa de Produtividade em Pesquisa CNPq, processo no. 350389/98-5

 

Abstract: The concept of genre as postulated by Bakhtin (1986) can be defined as a recurrent communicative event in which a given human activity, encompassing social roles and social relations, is mediated by language. In this sense, genre presupposes an interconnection between textual (language) and contextual features (the set of social relations involved). From a social perspective of genre (Ivanic, 1998:77), the present paper aims at discussing book reviews in English from the standpoint of three book review editors working in journals in the three disciplines of linguistics, chemistry, and economics. The focus of attention is the discursive practices in the North-American university context and how they respond to cultural factors that determine who should or can write what to whom. The interviews with the three book review editors reveal the hegemonic character of academic interactions and how it is construed and maintained through discourse and academic literacies.

 

0 Introdução

O conceito de gênero pode ser pensado a partir de Bakhtin (1986) como um evento recorrente de comunicação em que uma determinada atividade humana, envolvendo papéis e relações sociais, é mediada pela linguagem. Assim, o conceito de gênero pressupõe uma interconexão entre fatores textuais (da linguagem) e fatores contextuais (das relações sociais envolvidas). Considerando essa visão de gênero, o presente trabalho busca discutir a resenha acadêmica em inglês, em três disciplinas: lingüística, química e economia.

Neste trabalho, me proponho a investigar práticas discursivas - de acordo com Fairclough (1992), os processos de produção, consumo e distribuição de textos - no contexto acadêmico. Meu objetivo é contribuir para a pesquisa em Lingüística Aplicada que se dedica a subsidiar o ensino de Línguas para Fins Acadêmicos, oferecendo dados sobre como o gênero resenha é produzido, publicado e lido. Essas informações têm relevância tanto para professores quanto para aqueles alunos que, apesar de sua inexperiência na publicação acadêmica, buscam se engajar no debate corrente de sua disciplina via texto escrito. Embora o recorte feito se situa no contexto universitário norte-americano, acredito que a discussão apresentada é relevante para o estudo das práticas discursivas acadêmicas brasileiras.

O artigo se devide em cinco partes. Na primeira, faço uma breve discussão da concepção de linguagem que adoto no trabalho. Na segunda, defino os procedimentos adotados no estudo. Na terceira parte, discuto os resultados em relação aos editores, aos resenhistas, a cada disciplina, à audiência-alvo, ao conteúdo do gênero resenha e aos critérios de avaliação de um novo livro. Na última seção, apresento as considerações finais do estudo.

 

1 Concepção de linguagem como gênero

O foco deste trabalho recai sobre as práticas discursivas nas áreas de Lingüística, Química e Economia, sob uma perspectiva que se situa entre duas visões confluentes da linguagem (Ivanic, 1998:77).

A primeira, sócio-construtivista, poderia ser definida por sua ênfase na construção do conhecimento do sujeito sobre normas, convenções e valores associados à linguagem como resultado das forças e relações que se estabelecem na comunidade em que se inscreve. Essa concepção particular sobre linguagem surge do processo auto-regulador de comparação, reelaboração e negociação entre modelos pessoais do mundo e novos ínsights discrepantes; um empreendimento humano de formação de significados com ferramentas e símbolos culturalmente desenvolvidos e por meio da atividade social, do discurso e do debate (Fosnot, 1998).

Nesse sentido, a concepção do sujeito sobre o texto acadêmico é um reflexo da interação sócio-histórica de um grupo de pessoas que se definem, entre outras coisas, por suas práticas discursivas (Ivanic, 1998:78). Essa interação sócio-histórica do grupo gera as condições de produção, distribuição e consumo de um dado texto.

Na visão socio-interacionista de linguagem, a ênfase está nas trocas simbólicas da comunicação em tempo real em um dado evento discursivo (Ivanic, 1998:77). Nesse sentido, o texto acadêmico é produto da interação projetada entre o texto e outros textos que o precederam ou seguirão, e entre autor e leitor - para citar apenas dois participantes do evento de leitura.

Ao me situar no entremeio dessas duas visões tento enfocar a interação entre subjetividades e as 'normas da cultura' em que operam, entendendo o conceito de 'gênero' como formas estáveis de uso da linguagem que estão intimamente associadas com formas particulares de atividade humana. Assim, gênero é parte do que Wittgenstein ([1953]1958:10, §21) chamou de 'técnica de uso da linguagem'. O ser humano, ao se envolver em 'jogos de linguagem', engaja-se em uma 'forma de vida' (ibid.:88, § 241), uma atividade significativa em que compartilhamos atenção sobre um mesmo objeto/objetivo (Tomasello, 1999:108), que pressupõe uma forma, conteúdo e função específicos, recriáveis a partir da experiência humana em uma dada cultura. É com base nessa inserção cultural que desenvolvemos nosso repertório de gêneros.

 

2 Metodologia

 Tendo em vista essa concepção de gênero e da base social-interativa da linguagem, tento relatar, neste trabalho, algumas das descobertas feitas em um estudo explratório-descritivo, de inspiração etnográfica, sobre resenhas em Economia, Lingüística e Química, a partir de entrevistas realizadas, no ano de 1994, com membros do contexto estudado. Os entrevistados são professores universitários de instituições norte-americanas (Química e Lingüística no estado de Michigan e Economia na Califórnia) e editores de renomados periódicos publicados nos Estados Unidos. Esses editores falaram sobre o significado do gênero para cada área e das maneiras como membros de cada área estudada interagem por meio do gênero resenha na atividade humana de construção do conhecimento.

O editor de química, à época trabalhava, havia 20 anos, para o Journal of the American Chemical Society (referido aqui como JACS) e estava em processo de aposentadoria da Universidade de Michigan. O editor de lingüística trabalhava com o Studies in Second Language Acquisition (Studies) e, à época, trabalhava na Universidade Estadual de Michigan. O editor do Journal of Economic Literature (JEL) trabalhava na Universidade de Stanford na Califórnia. Esses títulos foram selecionados a partir do Source Index do Social Sciences Citation Index (Garfield, 1989a; 1989b) e no Science Citation Index (Garfield, 1989c; 1991) que traz as revistas mais citadas por área no ano de 1989 e 1990. Os editores serão referidos aqui como [Q] para Química, [E] para Economia, e [L] para Lingüística, conforme indicado na Tabela 1:

Tabela 1 - Editores entrevistados

Disciplina

Editor

Revista

Química

Q

JACS (Journal of the American Chemical Society)

Economia

E

JEL (Journal of Economic Literature)

Lingüística

L

STUDIES (Studies in Second Language Acquisition)

 

As perguntas feitas aos três editores versaram sobre questões variadas tais como o conteúdo, a forma, a organização e a importância da informação que eles esperavam encontrar no texto ou pensavam que a audiência-alvo das revistas esperaria ver em um exemplar típico do gênero, conforme exemplos abaixo:

1. Que tipo de informação seus colegas procuram quando lêem resenhas? Qual a informação central em uma resenha?

2. Quais suas razões particulares para ler resenhas?

3. Como você descreveria o processo de determinação de quem vai resenhar o quê? Como determinar a pessoa certa para resenhar um dado livro? Em sua opinião, essa pessoa deve ser ou é um especialista?

4. Quais os objetivos do resenhista ao produzir o texto (interesses pessoais X dever profissional)?

5. As resenhas acadêmicas são relevantes? Em que medida? Como resenhas afetam a área?

As entrevistas foram realizadas com cada editor em mais de uma data e em diferentes modalidades: pessoalmente, no caso do editor de química; por correio eletrônico, no caso da editora de lingüística; ou por telefone, no caso do editor de economia. As entrevistas ao vivo e pelo telefone foram gravadas em fitas cassete e posteriormente transcritas e as entrevistas por correio eletrônico foram gravadas em disco.

A discussão sobre o gênero resenha toma por base, portanto, os comentários desses editores, bem como alguma informação que obtive na literatura escassa sobre resenhas (referências ao final do artigo) e os resultados de um estudo anterior em que desenvolvi uma análise de exemplares do gênero (Motta-Roth, 1998).

 

3 Resultados

3.1 Editores

Editores de resenha (R) são responsáveis pela escolha do tipo de material que receberá uma crítica especializada e por determinar essa tarefa a um membro da comunidade disciplinar.

Os três editores têm uma visão bastante uniforme em relação a quem cabe a autoria de Rs, conforme as palavras de E:

[E]

Geralmente, tanto pesquisadores experientes quanto iniciantes são convidados. É provavelmente mais fácil conseguir um iniciante.

Uma vez que JACS, Studies, e JEL são revistas importantes em suas respectivas áreas, o ato de decidir quem resenhará o livro e de convencer o resenhista produzirá efeitos na comunidade disciplinar.

 

3.2 Resenhistas

[E]

Geralmente as pessoas recusam-se a escrever resenhas porque esses textos não contam muito para promoção... Pesquisadores iniciantes vêem isso como uma oportunidade de ver seu nome publicado. Pesquisadores experientes já não vêem isso como novidade. Eles muitas vezes têm mais tarefas administrativas também e, portanto, menos tempo...Geralmente uma pessoa iniciante nunca fez isso antes ou com pouca freqüência e gostaria de tentar fazê-lo.

Todos os três editores concordaram que pesquisadores experientes não escrevem Rs regularmente por falta de tempo e interesse, mas o gênero pode desempenhar para eles uma função social especial de mencionar o trabalho de outros colegas com mesma experiência na carreira. Para membros menos ativos na disciplina, a R é uma oportunidade de fazer uma pequena, mas talvez freqüente contribuição para a academia.

Parece que pesquisadores iniciantes geralmente estão mais dispostos a resenhar um livro do que os mais experientes, uma vez que isso pode ser uma forma de participar no debate da disciplina por meio de uma tarefa menos complexa do que, por exemplo, um artigo, que requer mais tempo para leituras e procedimentos de pesquisa. De acordo com Q, pesquisadores em química estão, em geral, muito ocupados tentando publicar mais artigos (e menos livros), e, por essa razão, fica muito difícil encontrar uma pessoa disponível ou simpática à idéia de escrever uma crítica sobre o texto de outro colega. Entretanto, Q tende a buscar (sem muito sucesso) nomes consagrados na área e define a tarefa como 'uma questão de desespero'.

[Q]

Você usa qualquer fonte disponível: conhecimento de quem é um expert em qual área, colegas, amigos, qualquer jeito. (...) Anúncios da NSF (National Science Foundation) sobre quem ganhou bolsas também dão indicações sobre quem é um expert em cada área. O editor então relaciona a lista de nomes com a lista de títulos esperando por resenhas (geralmente 700 livros por ano).

De acordo com E, 'Um banco de dados natural [com nomes de pesquisadores que têm experiência em áreas específicas] é a lista de membros da Associação [Americana de Economia].'

Os editores enfatizaram que Rs têm uma caráter 'discreto', isto é, não são importantes para engrossar um curriculum vitae ou para ganhar promoção (conforme apontado, na literatura, por Wiley, 1993).

Em alguns casos, o caráter pouco notável do gênero deve-se simplesmente ao baixo status que livros têm em relação a outras media na disciplina. De acordo com um estudo desenvolvido sobre Rs em revistas de astronomia e geologia (Chen, 1976), há alguma base para essa crença. Chen descobriu que essas revistas não publicam Rs consistentemente e sugere que, nessas disciplinas, livros talvez não sejam o modo preferido de disseminar informação disciplinar. Essa crença encontra apoio nas palavras do editor de economia:

[E]

 O que tem acontecido ao longo do tempo é que em economia o papel dos livros como um todo, sua importância, caiu em relação ao papel dos artigos. Assim alguém movido por interesse profissional dedicará seus esforços para escrever um artigo, ao invés de preparar a resenha de um livro que, de saída, talvez tenha uma importância questionável.

Já em lingüística, a R depende de preferência ou talento pessoais: [L] Algumas pessoas são melhores produzindo o trabalho, enquanto outras são melhores avaliando ou criticando trabalho, e outras ainda fazendo ambos. Aqueles que fazem sua contribuição para o desenvolvimento da ciência de maneira mais criativa parecem ser considerados profissionais mais significativos, embora resenhistas não devam ser vistos como não-importantes.

A crença tácita de que pesquisadores iniciantes são responsáveis pelo gênero foi testada (Motta-Roth, 1995) através dos dados coletados no sistema de consulta computadorizada entre bibliotecas (MIRLYN) na Universidade de Michigan e os Citation Index (Garfield, 1989a; 1991). Foi investigada a carreira de 180 resenhistas (60 em cada disciplina) em número de anos e produção acadêmica (p. ex. livros, artigos) anterior a 1990. O ano da publicação do primeiro livro ou artigo pelo resenhista, conforme indicado nesses catálogos de referência e no sistema MIRLYN, foi considerado o início da carreira de publicação do resenhista.

A produção acadêmica foi classificada em termos das diferentes entradas dos nomes dos resenhistas nos Índices (artigos) e no sistema MIRLYN, usado, na época, na Universidade de Michigan para consultas computadorizadas entre bibliotecas (livros). Um resenhista era considerado um pesquisador experiente (senior) se fosse enquadrado em dois critérios:

1) tivesse, pelo menos, um livro publicado há mais de 15 anos; ou

2) tivesse publicado por mais de 8 anos, com mais de 2 artigos publicados por ano.

Todos os outros resenhistas que não se enquadraram em pelo menos um desses dois critérios foram classificados como pesquisador iniciante.

Os resultados demonstraram que 63% desses resenhistas poderiam ser considerados pesquisadores seniores à época que a R foi publicada, portanto mesmo que editores aleguem dificuldades, eles tendem a escolher pesquisadores consagrados para avaliar material novo na área. Pode-se pensar que críticas com autoridade intelectual legitimada na disciplina tendem a ser preferidas devido ao seu maior impacto na área em comparação ao texto de um novato.

Resenhistas também parecem ter razões 'sociais' para resenhar livros tais como manter boas relações com outros profissionais da àrea. Conforme ilustrado por Q, há normas sociais e relações de poder em química que são exercitadas através do gênero. Parece haver uma norma social de manifestação de concordância entre colegas:

[Q]

Geralmente não há interesse pessoal em publicar uma resenha exceto para poder expor publicamente suas próprias opiniões. Um caso especial é quando você tem em alta consideração alguém que escreveu um livro e você gostaria de resenhar esse livro para dar a ele uma boa resenha porque você está convencido que é um bom livro.

Evidencia-se aqui um certo tipo de relação de poder entre membros que apóiam uma certa abordagem à disciplina:

[Q]

Ao mesmo tempo em que você não quer que o livro receba uma resenha fraca ou inapropriada, ao escrever a resenha você mesmo, você pode fazer com que esse livro importante seja resenhado apropriadamente, enfatizando os pontos bons e dando aos pontos ruins uma perspectiva apropriada.

Ou ainda uma relação de poder tácita entre colegas de manter um círculo fechado ('inner circle') que controla e orienta o debate disciplinar:

[Q]

Há finalmente a situação em que se tem um livro que necessita ser resenhado, contata-se um colega, dizendo que se precisa ter esse livro resenhado e preferencialmente por alguém que realmente entende do assunto. Como um favor pessoal àquela pessoa, o colega pode concordar em fazê-lo.

A imagem da química que se delineia aqui é a de uma matriz disciplinar tecida de forma bastante fechada onde editores contatam membros experts e pedem a eles 'favores pessoais'.

Há, portanto, diferentes razões para se usar o gênero. No veio central da academia, certamente não para obter projeção ou progressão na carreira mas, até certo ponto, para reafirmar, junto aos colegas, a competência e a autoridade próprias em avaliar a literatura na disciplina. Conforme as palavras de L:

[L]

... resenhas são uma contribuição importante para a área. Elas são uma maneira de estabelecer algum tipo de controle e balizas (...) Resenhas são importantes para a área como um todo e para os pesquisadores em particular de maneira diversa do artigo acadêmico. Resenhas são extremamente valiosas ao informar a comunidade acadêmica sobre novas publicações e como essas se relacionam ao trabalho individual de cada um de nós.

Além de servir a objetivos de interação e avaliação, Rs também fornecem um modo aos novatos ou membros menos conhecidos de usar as revistas acadêmicas como um fórum para apresentar a si mesmos como participantes ativos nos debates da comunidade disciplinar.

 

3.3 Comunidade disciplinar

[L]

Para SSLA, resenhas são uma contribuição importante para a área. Elas são uma maneira de estabelecer algum tipo de controle e harmonização. Outras revistas podem não ter a equipe ou a inclinação para fazê-lo, primeiramente porque resenhas não são o foco central da revista. Resenhas são valiosas para a área e para o pesquisador em de uma maneira diferente da dos artigos. Resenhas são extremamente valiosas para informar a comunidade acadêmica sobre novas publicações e como elas podem se relacionar ao trabalho individual de cada um.

Conforme já mencionado, o gênero envolve uma rede complexa de relações entre escritor, leitor, editor, editora, etc. Em decorrência disso, é possível prever que boa parte dos 22 mil membros da Associação Americana de Economia, que recebem o Journal of Economic Literature, podem ser afetados de formas ainda não totalmente aquilatadas.

L nos informa que esses textos atuam como um mecanismo regulador que influencia o movimento oscilatório do pêndulo disciplinar em favor de um ou outro autor, teoria, ou tendência. O gênero funciona assim como um pronunciamento, como um mecanismo de verificação de qualidade da tradição literária, exercendo algum tipo de força centrípeta (nos termos de Bakhtin) em acomodar o novo livro na rede de publicações existente e no atual estado de conhecimento da disciplina. A avaliação do resenhista é uma crítica interpretativa consoante com as 'discussões atuais na área mais ampla...em publicações profissionais, conferências, e...esferas institucionais' em geral (ibid.:480) que participam na configuração da disciplina. O gênero pode ser visto como um mecanismo de controle do acesso ao debate acadêmico ('gatekeeping power', conforme Wiley, 1993:477) que varia com o reconhecimento desfrutado pelo resenhista, a relevância do livro, e o status da revista em que o texto é publicado. Em meio a esse contexto, qual a razão para se lerem Rs do ponto de vista da audiência-alvo?

 

3.4 Audiência-alvo

[E]

[Eu leio resenhas] em grande parte para saber o que as pessoas andam dizendo ou discutindo ou que resultados estarão contidos em um livro. E também o que as pessoas pensam disso. Depois de ler a resenha, não é que eu vá comprar o livro, mas é bem provável que eu o retire da biblioteca.

Em geral, fatores contextuais como a necessidade de informação eficiente sobre material novo e especialmente os altos custos dos livros para aquisição pessoal são as razões para as pessoas lerem Rs. Para Q: quanto mais caro o livro, mais as pessoas lêem Rs antes de comprá-lo.

As expectativas em relação à informação a ser encontrada em Rs revelam diferentes concepções de audiência. O químico espera um leitor em busca de comentários objetivos:

[Q]

O objetivo da resenha é informar o colega químico do conteúdo e do valor do livro....

Para L, lingüistas buscam uma análise profunda do livro, uma crítica elaborada, uma avaliação das conexões existentes entre os diferentes tópicos. Finalmente, o economista se preocupa com uma audiência que procura um texto autoral, essencialmente argumentativo, com o resenhista 'instruindo' o leitor sobre como ver o livro:

[E]

A idéia é tentar colocar o livro em algum tipo de contexto. (...) E eu penso que isso ajuda as pessoas que não conhecem a área muito bem, ajuda-os a localizar o papel desse livro que está sendo resenhado.

O leitor é apontado aqui como 'uma pessoa que não conhece a área', e assim a relação entre leitor e resenhista parece menos simétrica do que em química, onde o leitor é o 'colega químico'. Ao discutir a ética do gênero R, Wiley (1993) examina essa questão em relação às variações no status científico à medida que se atravessa fronteiras disciplinares. Ele acredita que em 'disciplinas não tão bem estabelecidas onde membros não compartilham amplamente um complexo de teorias como nas ciências humanas' (ibid.:483), resenhistas enfrentam o desafio de escrever Rs, construindo um contexto disciplinar para enquadrar o novo livro para o leitor. Wiley enfatiza uma perspectiva assimétrica entre escritores e leitores em lingüística. Seu conselho é de que resenhistas não devem tomar como dado um amplo conhecimento compartilhado com a audiência, tendo em mente que leitores podem não ter informações relevantes sobre o tópico do livro, as metodologias de pesquisa comumente adotadas no tratamento dos tópicos, ou ainda sobre a literatura invocada pelo resenhista (ibid.:482).

Em vista disso, é relevante fazer algumas considerações acerca do conteúdo informacional característico desse gênero.

 

3.5 Conteúdo da resenha

[L]

 É desejável manter um balanço entre linguagem descritiva e avaliativa. Algumas pessoas enfatizam mais uma do que outra. É difícil separar avaliação de descrição uma vez que [o ato de] decidir descrever algumas partes e não outras já é uma avaliação.

Em um livro escrito há mais de trinta anos, Drewry (1966:57) afirma que o objetivo fundamental do gênero é responder questões básicas sobre um dado livro: quem escreveu, sobre o que é o livro, como ele se compara com livros do mesmo autor, sobre o mesmo tópico, ou na mesma área. Mais recentemente, Steiner (1981) postula que o resenhista de qualquer livro acadêmico deveria levantar alguns aspectos básicos, tais como a medida em que o autor atingiu com sucesso os objetivos estabelecidos para o livro ou o rigor mantido com as referências ou ortografia:

[E]

Há realmente dois objetivos principais dessas resenhas. O primeiro objetivo é dizer ao leitor exatamente o que ele vai encontrar dentro do livro. Em outras palavras, o objetivo é descrever as linhas gerais do argumento ou descobertas do livro. O segundo objetivo de uma resenha é oferecer algum tipo de avaliação do livro. Assim há dois objetivos principais e a meta do resenhista é tentar combinar descrição e avaliação em mais ou menos 900 palavras.

É interessante notar como esse conceito do 'que está dentro do livro' se configura para cada editor. Enquanto que em química, significa o âmbito do livro e nível em que os conteúdos são apresentados, em economia, o interior de um livro é visto mais em termos das 'linhas centrais do argumento ou as descobertas principais do livro', mais próximo do editor em lingüística: 'uma maneira de estabelecer algum tipo de controle e parametrização.'

Conforme a literatura na área (Drewry, 1966; Steiner, 1981), há pelo menos dois tipos de informação necessárias em Rs: 1. descrição do livro (p.ex., autor e utilidade para o leitor) e 2. avaliação dos pontos fortes e fracos no livro (p.ex., em que medida o livro cobre tópicos centrais e difíceis).

Numa análise anteriormente realizada de 180 resenhas em inglês (Motta-Roth, 1998), divididas igualmente entre as três disciplinas incluídas no presente estudo, foi possível perceber que embora raras, as Rs avaliativas ocorrem em química e podem trazer uma crítica bastante negativa conforme Q:

[Q]

Às vezes você reconhece que um autor pode ter sido muito competente anos atrás, mas agora ele está ultrapassado. Isso pode resultar em um ataque do resenhista ao editor do livro por ter permitido que um material tão ultrapassado seja publicado.

Os textos coletados em lingüística (em média 1.374 palavras) e economia (975) eram geralmente mais longos do que os de química (557), conforme exemplo da Tabela 2.

Tabela 2 - Exemplo de análise de um texto de química

[Q#1]

Apresentação do livro: This book surprisingly is very good. While most books of this ilk (technology introductions), in their effort to give cursory treatment to many topics, do not have sufficient depth in any topic to be useful, this one provides excellent coverage for chemists or other scientists or technologists not specifically schooled in testing and characterization of polymers.

Descrição da organização do livro: Topics include molecular structure and chemistry, morphology, technology (compounding, processing, adhesives, fibers, etc.), and mechanical, thermal, electrical, optical, and chemical properties. Test methods are described  including ASTM references) with drawings of instruments and graphs of data, the latter accompanied by discussions of interpretation.

Avaliação do livro de partes do livro: There is sufficient mathematical treatment of each appropriate topic to provide a good basis for understanding, but not so much as to overwhelm.  Bibliographies, at the end of each chapter, are extensive and are divided by subtopics from the chapter, a helpful touch. The book ends with thorough author and subject indices, a glossary, and an appendix of names and abbreviations.

Recomendação final: This book has wide appeal, yet depth sufficient to be quite useful. It should be on the shelves of chemists, engineers, or technologists who are involved in any way with polymer technology or testing.

 

Embora os editores concordem que informação e avaliação deveriam ser combinadas em porções iguais, o gênero pode ser considerado como envolvendo um contínuo entre descrição e avaliação, com diferentes exemplares de Rs tendendo na direção de um ou outro extremo. Foi possível constatar que as porções avaliativas - aqui definidas como Avaliação de pontos ir/relevantes do livro e Recomendação final para não ler/ler o livro - são consistentemente mais curtas e menos freqüentes em química do que nas outras duas disciplinas.

Rs mais objetivas, por exemplo, podem ser representadas por textos mais descritivos dos conteúdos do livro e que relacionam-no à área de maneira geral, com uma avaliação menos explícita e subjetiva do resenhista.

Nos textos mais subjetivos, o resenhista expressa sua visão pessoal sobre o valor da publicação para a área. Considerando-se as entrevistas de E e L, as Rs em economia e lingüística parecem tender na direção do extremo avaliativo do contínuo, onde o resenhista é um expert que parte de seu conhecimento e sua experiência profissionais para estabelecer a relevância do livro para a disciplina, conforme demonstrado na Tabela 3:

Tabela 3 - Exemplo de análise de um texto de economia

[E#1]

Apresentação do livro:  First, disclosure. Greg Davidson [o autor] once worked under my supervision. Both he and Paul Davidson are friends. An endorsement from my father graces the jacket of this book. And there is much between the covers with which I agree.

Economics for a Civilized Society is an essay on the theme that civic values must (in Etzioni’s phrase) "encapsulate" competition, restricting the play of self-interest and the "war of all against all." In a civilized society rules, codes, and restraints are internalized, observed voluntarily rather than imposed, and the social costs of order and discipline, whether measured in unemployment, expenditures on law and regulatory enforcement, or in outright repression, are correspondingly low.

Descrição da organização do livro: The authors apply this insight to current economic policy questions, including tax collection, inflation policy, unemployment, and international debt.

Their arguments with respect to the first two of these are especially persuasive. They describe, for example, how the 1983 Massachusetts tax amnesty program was designed not only to collect back revenues, but also to help restore respect for the tax code, making voluntary payment more likely in the future. This was achieved by a multi-step process, including tough new laws and an "enforcement shock, as part of which amnesty was merely the transitional mechanism [which] was needed to avoid the injustice of treating past behavior under the new normative standards" (p. 85). The success of the Massachusetts program is thus owed partly to having created a climate of reciprocally-perceived fairness, which fostered and rewarded a higher standard of citizenship, and so internalized the public virtue of voluntary taxpaying. This interpretation contradicts, the authors argue, that of conservatives who regard the amnesty as a mistake, and who assert that continuing improved revenue collections are due to stricter enforcement alone.

In restating the arguments for tax-based incomes policy (TIP), the authors again underline the importance of widespread public confidence in the policy in assuring its success. They emphasize the roles of public education, of administrative feasibility, of insulation from politics, and of the perception of permanence (institution-building) in the process of transition to any future TIP. In so doing, they implicitly criticize the past use of incomes policies by those who were publicly skeptical of their prospects or who promised that they would be only temporary; Nixon's price-wage programs broke down in part because the political leadership did not advance them with conviction.

Civic values can be eroded, even destroyed. In a telling phrase the authors assert that Gerald Ford's 1975 Whip Inflation Now campaign failed because "The public saw the WIN campaign as a stunt, not a policy” (p. 138). They view the deliberate unemployment, the assault on unions, the waves of deregulation, and the decline of public ethics under Ronald Reagan as part of an assault on the civic values, from which the polis may possibly, they fear, not recover. To the extent it does not, the ensuing necessary increase in directly repressive expenditures on social order, and the acceptance of permanently high unemployment and underemployment to control inflation, will be the symptoms of our decline from a civilized toward a barbaric society.

Avaliação do livro de partes do livro: To some extent, this clear theme gets lost in a disorderly presentation. The discussion of unemployment veers toward a private argument with the Monetarists over money; the authors make an unsupported and untenable denunciation of communications and of transport deregulation; they romanticize economic conditions in general in the period from 1945 to 1970; they conduct a side campaign against neoclassical methodology as a whole rather than merely against the extreme focus on individual self-interest characteristic of certain particular practitioners (e.g., Milton Friedman) who are evidently their main targets. Their discussion of Third World debt suffers from an exaggerated fear of the dangers of Latin American default to the banking system; after all, at present all but Mexico are in arrears on their debts, yet no US banks have failed from this cause, and with the recent partial sale and recapitalization of Manufacturers Hanover no such failure is likely. The greatest weakness of this book lies in a failure to recognize the large body of work in economics and related disciplines since Keynes that does attempt to grapple with sympathy, altruism, "the conscience,'' public spirit, and other irreducibly social constructs. Thus the authors isolate themselves more than necessary, tend toward caricature in their depiction of economists, and concede too much terrain to the intellectual empire of the extreme individualists.

Recomendação final: Economics for a Civilized Society is not a lonely beacon, but should rather be welcomed as one contribution to an expanding dialogue on the social aspects of policy design. Connoisseurs of the Davidson style will find in it a typically informed, energetic, digressive, committed essay, whose greatest strength lies in bringing to bear a civilized sensibility on policy problems that much of our profession does tend to view, too often, too narrowly.

O fato de que economistas dedicam maiores porções do texto à avaliação (em oposição aos químicos que enfatizam a descrição) e de que Rs mais explicitamente negativas foram encontradas em economia fazem com que essa última seja considerada a área mais avaliativa entre as três disciplinas. Essa explicitação da avaliação é indicada pela presença consistente de (i) tom pessoal, p. ex., 'Mas, ao menos eu [ênfase no original], não fiquei convencido pelas evidências apresentadas em The Economics of 1992'; (ii) explicitação, ausência de modalização e uso consistente de comentários negativos explícitos, p. ex., '[O livro] não é nem mesmo um estado-da-arte', 'Assim, é tudo menos boa propaganda [do autor].'; ou (iii) Enfraquecimento de comentários positivos com modalização, p. ex., 'Há provavelmente algumas passagens instrutivas [no livro]'. Essas características são incomuns nos textos de química.

Essas questões indicam que, ao elaborarem sua avaliação, resenhistas devem considerar o que é adequado ou inadequado em sua disciplina, harmonizando um objetivo de descrição do conteúdo do livro com a tendência a oferecer ao leitor sua opinião pessoal sobre o mesmo.

 

3.6 Critérios de avaliação do livro

Quando perguntados sobre o que seria um bom livro em sua área, os editores forneceram indicações sobre critérios de avaliação que são válidos em suas respectivas áreas. É válido dizer que comunidades disciplinares diferentes têm diferentes padrões para avaliar livros. O que resenhistas levam em consideração quando avaliam uma nova publicação varia de uma disciplina para outra. Em química, preza-se:

[Q]

Um livro que traga novas informações ou jogue luz sobre velhas questões. Elementos como índices são importantes em um livro científico.

Como se pode ver, em química, é a data das referências e o material visual tais como índice, tabelas, gráficos, que geralmente ajudam os leitores a ler o texto mais rápida e eficazmente. Em economia, resenhistas focalizam na consistência do argumento e no tratamento matemático dado à discussão:

[E]

A idéia de um bom livro em economia é um livro escrito claramente, bem argumentado, organizado por tópicos, isso é que um economista pode considerar como "real valor", há algo além do conhecimento que um livro fornece. Algo que não é uma revisão de material antigo. Por causa do fato da área ter se tornado mais matemática, os livros estão trazendo mais tabelas e gráficos, com mais material visual.

Em lingüística, o livro parece ser valorizado por sua capacidade de inovar a área e responder às expectativas dos leitores:

[L]

Novo e interessante para os leitores da revista, apresentando um novo modo de olhar o assunto, com uma visão clara dos argumentos presentes no livro.

Em resumo, publicações novas são examinadas sob luzes diferentes em cada disciplina. A avaliação dos resenhistas é afetada por diferentes questões tais como a natureza dos assuntos tratados, o tratamento do corpus, a velocidade com que os programas de pesquisa avançam em cada disciplina.

 

4 Observações finais

A discussão no presente trabalho levanta questões relacionadas às diferenças nas práticas adotadas para resenhar em diferentes disciplinas. Se Rs respondem às necessidades da ciência de avaliação e validação da literatura científica, então variações em traços tais como critérios para avaliação e descrição sinalizam diferentes práticas disciplinares no uso do mesmo gênero. Tais variações disciplinares devem ser levadas em consideração por lingüistas do texto e professores de redação acadêmica e leitura para fins acadêmicos para que se adaptem procedimentos analíticos e pedagógicos a cada área específica.

Um efeito colateral da análise surgiu ao longo do processo uma vez que a descoberta da localização geográfica desses resenhistas parece indicar que o caráter 'internacional' da academia moderna é um tanto restrito em vista da afiliação universitária dos resenhistas. No corpus, 76.11% dos resenhistas estavam trabalhando ou nos E.U.A. (57.22%) ou no Grã-Bretanha (18.89%) à época, e a maioria dos restantes (19.44%) estavam em outros países europeus.

Considerando-se que:

a) as revistas americanas são comumente consideradas como o veículo de publicação das versões mais recentes de ciência em quase todas as áreas (John Maddox, o editor da revista Nature, esteve no Brasil há alguns anos para um congresso sobre jornalismo científico e afirmou que aproximadamente 75% de toda a produção de pesquisa mundial hoje em dia é desenvolvida nos E.U.A (Folha de São Paulo, 26.09.94);

b) essa 'ciência' está sendo produzida através do trabalho realizado em todo o planeta;

c) cientistas do mundo inteiro têm (ou espera-se que tenham) a oportunidade de publicar os resultados de suas pesquisas usando a língua inglesa como lingua franca da academia; então deveríamos esperar que Rs nessas revistas sejam escritas por especialistas espalhados pelo mundo. Isso, entretanto, não acontece: especialistas que escrevem Rs não são apenas exclusivamente associados a instituições norte-americanas, mas também seus textos enfocam quase que exclusivamente livros escritos em inglês (95.56% dos títulos dos livros são em inglês) e publicados ou nos E.U.A. (57.22%) ou no Grã-Bretanha (18.89%).

Se considerarmos que apenas 3 dos 103 resenhistas trabalhando nos E.U.A. avaliaram um livro em alguma língua além do inglês, ficamos com uma imagem bastante limitada do que deveria ser o 'cenário acadêmico internacional'. A imagem é ainda mais surpreendente se atravessamos fronteiras disciplinares. Duas das revistas analisadas em química são publicadas em países de língua não-inglesa. Em Recueil des Travaux Chimiques des Pays-Bas, publicada na Holanda, por exemplo, os sete resenhistas são afiliados com universidades européias e, mesmo que quatro dos livros resenhados tenham sido publicados num país de língua não-inglesa (Holanda ou Alemanha), todos os títulos estavam em inglês. Um padrão similar é encontrado na revista Angewandt Chimie, publicada na Alemanha.

Essa parece ser uma imagem bastante endógena da ciência em geral, e em química em particular. Ao usar inglês como sua lingua franca para publicar e resenhar livros, a academia tenta encorajar a troca de informação científica através de fronteiras lingüísticas. O tiro sai pela culatra, no entanto, quando vemos que 'a troca de informação' está circunscrita quase que exclusivamente às fontes com títulos em inglês, publicadas e resenhadas em países de língua inglesa. Os resultados revelam uma academia que fala inglês, especificamente situada nos E.U.A. (e Grã-Bretanha), que se alimenta de si mesma e de seus subprodutos, demonstrando não ter nenhuma necessidade da produção ou das preocupações alienígenas de outros países. Considerando-se esses dados, a comunidade científica parece mais 'nacional' do que 'internacional'. É claro que se pode esperar que os resultados do presente estudo demonstrem uma visão bastante 'Americanizada' de cada área considerando-se que o catálogo de citações que definiu quais as 20 revistas a serem investigadas são publicadas nos E.U.A., e, conforme mencionado, 75% da pesquisa hoje no mundo é desenvolvida nos E.U.A. e, portanto, a situação pode ser inescapável. Todavia, seria interessante verificar até que ponto os resultados são consistentes com aqueles de revistas publicadas em países fora do eixo central como o Brasil.

Neste trabalho, procurei discutir o caráter sócio-construtivo das práticas discursivas da academia no sentido de demonstrar que os processos de produção, consumo e distribuição de textos no contexto universitário norte-americano respondem a fatores culturais que determinam quem pode ou deve escrever o quê para quem. A partir das entrevistas relatadas aqui, é possível perceber o caráter hegemônico das interações acadêmicas e como a hegemonia é de fato construída e mantida através do discurso e das literacias ou letramento - as práticas de uso da língua escrita (Clark & Ivanic, 1997:29). A relação entre poder e letramento acadêmico (academic literacies) pode ser definida nos seguintes termos: pesquisadores com maior poder são os produtores de texto, enquanto que os iniciantes (ou sem poder para interferir nos rumos dos programas de pesquisa) em cada área tornam-se o público-alvo para quem os mais poderosos escrevem. Pesquisadores menos experientes parecem ter mais disponibilidade de tempo para escrever Rs em vista de seu caráter menos relevante se comparado com artigos e livros. No entanto, os editores tentam buscar pesquisadores experientes para desenvolver o papel de balizas na construção da disciplina ao avaliar novos livros. Segundo o editor de Química, muitos autores de renome acham uma afronta um periódico encomendar uma R a um colega menos experiente.

A discussão desenvolvida aqui retrata uma comunidade disciplinar que reproduz as mesmas relações de poder que Clark & Ivanic (idem:42) detectam na sociedade em geral:

A vasta maioria da produção escrita que tem alto valor social, prestígio e poder, governa nossa vidas, e determina nosso entendimento da sociedade é feita por uma minoria muito pequena da população.

 

Referências

 

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