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Revista Literatura e Autoritarismo
Dossiê Walter Benjamin e a Literatura Brasileira
Capa | Editorial | Sumário | Apresentação        ISSN 1679-849X Dossiê nº 5 

NIETZSCHE, WALTER BENJAMIN, GUIMARÃES ROSA: UMA IDÉIA DE HISTÓRIA

Luiz Roncari


O que irei apresentar será apenas o esboço [quase uma colagem de textos] de um trabalho que deverei concluir ainda neste semestre, espero. Isto porque, a leitura de um livro de Guimarães obrigou-me a entrar em áreas, como a da filosofia da história, e tratar de autores, como Nietzsche e Walter Benjamin, que, se tenho alguma familiaridade com eles, não os domino nem são de minha competência.Tudo começou com o estudo de uma das novelas do livro Corpo de Baile, “Buriti”, sobre a qual acabo de concluir um livro: Buriti do Brasil e da Grécia (patriarcalismo e dionisismo no sertão). Sobre o livro Corpo de Baile, eu já havia escrito que ele realizava a trajetória cíclica de um dia: começava na manhã do menino Miguilim, de “Campo Geral”, no ninho de afetos de uma família patriarcal falida e que se desintegrava; transitava pela novela solar do Pinhém, “A estória de Lélio e Lina”; e terminava nas noites do sertão, do entardecer de “Dão Lalalão” às noites altas de “Buriti”. Este roteiro dos quatro “romances” está enunciado no segundo índice das duas primeiras edições de Corpo de Baile, colocado no final do livro. Nele, o autor divide as sete estórias em dois grupos: os referentes às diferentes fases do dia, que ele classifica como “Gerais” e seriam “Os romances”; e os que estariam fora do ciclo, que ele classifica como “Parábase”, que ele considera como “Os Contos”, que compreenderiam “Uma estória de Amor”, “O Recado do Morro” e “Cara de Bronze”. Na última estória, “Buriti”, o menino Miguilim ressurge já crescido e homem feito, como o moço Miguel, que vinha para formar uma nova família, agora plantada nas tradições fundamente patriarcais de iô Liodoro, e, com isso, se reintegrar.1 Até aí eu vislumbrava apenas a arquitetura cíclica do livro, de começo, meio e fim, cujo final era de certa forma um recomeço, porém em outras bases, o que lhe dava uma certa unidade. As diferentes fases do dia, que aguçavam diferentes sentidos, o olhar de Miguilim, o tato afetivo de Lélio, o gosto olfativo de Soropita, e a sinfonia pastoral carregada de ruídos de Buriti, compunham as partes do livro. E a dispersão das personagens da primeira estória, os reagrupamentos nas novelas intermediárias e a reintegração final de Miguel, formavam as ranhuras que amarravam o seu conjunto. Porém, foi ao estudar e analisar “Buriti”, que pude perceber como esses elementos de composição, que sustentavam a unidade do livro, tinham também um fundo ideológico, quer dizer, continham uma visão da história e uma concepção da vida e do mundo, o que não era pouco. O que me parece cada vez mais, e é meu atual objeto de estudo e verificação, é que essa novela, na verdade, e isto fica claro principalmente no seu fecho, realiza no plano literário o que Nietzsche tinha muito por vitalismo, dionisismo e eterno retorno (conceitos muito discutidos, nem sempre claros, devido principalmente à forma fabular com que foram apresentados).
A partir das análises das visões de uma personagem iluminada, do Chefe Zequiel, que chamei de “paisagens acústicas noturnas”, pude notar como deixavam reconhecer no seu fundo um movimento dionisíaco de morte e vida, destruição e ressurreição. Ele é apreendido pela intuição de Zequiel, fundada na sua extraordinária capacidade auditiva, como se fosse a própria música do mundo da natureza e dos fenômenos, o que equivalia a sua essência ou coisa em si. Isto estaria próximo das idéias de Nietzsche e o seu conceito de trágico, em especial nestas duas passagens de O Nascimento da Tragédia: 16/ “[...] só a partir do espírito da música compreendemos um prazer na destruição do indivíduo. Porque através dos exemplos isolados de tal destruição torna-se claro para nós apenas o eterno fenômeno da arte dionisíaca, que expressa a vontade na sua onipotência, de certo modo por detrás do principium individuationis, a vida eterna para além de todo o fenômeno e apesar de toda a destruição. O prazer metafísico perante o trágico é uma tradução da sabedoria dionisíaca, instintiva e inconsciente, para a linguagem imagética: o herói, fenômeno supremo da vontade, é negado para prazer nosso por ser apenas fenômeno e a vida eterna da vontade não ser tangida pela sua destruição. ‘Cremos na vida eterna’, clama assim a tragédia, enquanto a música é a idéia imediata desta vida. Totalmente distinto é o objetivo do artista plástico: aqui, Apolo supera o sofrimento do indivíduo através da luminosa glorificação da eternidade do fenômeno, aqui a beleza vence sobre o sofrimento inerente à vida, a dor é de certo modo subtraída, pela arte da mentira, aos traços da natureza. Na arte dionisíaca e no seu simbolismo trágico, a mesma natureza fala-nos com a sua verdadeira voz, sem disfarce: ‘Sede como eu sou! Sob a incessante mudança dos fenômenos, a mãe primordial eternamente criadora, eternamente impelindo à existência, encontrando eternamente uma satisfação nessa mutação dos fenômenos!’”/ 17/ “Também a arte dionisíaca nos quer convencer do eterno prazer existencial: simplesmente, devemos procurar tal prazer não nos fenômenos mas por detrás dos fenômenos. Devemos reconhecer como tudo o que nasce tem de estar pronto para um doloroso declínio, somos obrigados a olhar para dentro dos horrores da existência individual – e contudo não devemos ficar transidos: uma consolação metafísica arrebata-nos momentaneamente à engrenagem das figuras em mutação. Somos realmente, por curtos instantes, a própria essência primordial e sentimos os seus irrefreáveis avidez e prazer existenciais; a luta, a tortura, a destruição das aparências, surgem-nos agora como necessárias perante o excesso de inúmeras formas de existência que se impulsionam e chocam num ímpeto vital, perante a exuberante fecundidade da vontade universal; somos perpassados pelo furioso espinho destes sofrimentos no mesmo instante em que nos tornamos, por assim dizer, um só com o incomensurável prazer existencial originário e em que pressentimos a indestrutibilidade e eternidade de tal prazer, em êxtase dionisíaco. Apesar do pavor e da compaixão, somos os felizes seres vivos não como indivíduos mas como a coisa viva, fundindo-nos como o seu prazer procriador.”2
A partir de determinado momento da novela, o forte conteúdo erótico-dionisíaco nela presente, parece aproximar-la mais do de Nietzsche do que do de Karl Kerényi, pelo modo quase pagão com que o autor passa a reverenciar o culto à vida e naturaliza a morte, como elementos integrantes do ciclo do eterno retorno. Este último, nos seus estudos sobre o dionisismo, antes mesmo de seu grande livro, Dioniso, incorpora esse movimento fundamental da vontade nietzscheano através dos conceitos distintos de bios – como a vida individual e a caminho da morte, a biografia –, e de zoé – a vida da natureza, permanente e indestrutível –, mas não via um antagonismo radical entre ele e o cristianismo. Kerényi deve ter sido uma fonte importante de Guimarães Rosa, tanto por isso como pelo papel decisivo que dava ao erotismo na sua concepção do dionisismo e que tem uma significação equivalente na novela. O que ressalta agora a maior aproximação de Guimarães de Nietzsche é o modo como este descreve a oposição entre as duas figuras simbólicas, num dos fragmentos de seus escritos de publicação póstuma, A Vontade de Poder: “Os dois tipos: Dionisos e o Crucificado.- Há de verificar-se: o homem religioso típico – se é uma forma de décadence? Todos os grandes modernos são doentes ou epiléticos –: mas não deixamos então de fora um tipo do homem religioso, o pagão? Não é o culto pagão uma forma de agradecimento e de afirmação da vida? Não haveria de ser o seu supremo representante uma apologia e divinização da vida? O Tipo de um espírito bem-aquinhoado, arrebatado e transbordante... o tipo de um tipo de que recolhe em si e redime as contradições e tudo o que é problemático na existência!/ - Aqui ponho o Dionisos dos gregos: a afirmação religiosa da vida, da vida inteira, não negada ou dividida; - é típico: que o ato sexual desperte profundeza, mistério, veneração./ Dionisos contra o ‘Crucificado’: aí tendes vós a oposição. Não é uma diferença no que toca ao martírio – o martírio tem um outro sentido. A vida mesma, a sua eterna fertilidade e o seu eterno retorno, condiciona o tormento, a destruição, a vontade de aniquilamento... No outro caso, o sofrimento, o ‘Crucificado como inocente’, vale como objeção contra esta vida, como fórmula de sua condenação. – Adivinha-se: o problema é o do sentido do sofrimento: se é um sentido cristão ou se é um sentido trágico... No primeiro caso, ele deve ser o caminho para um ser bem-aventurado; no segundo, o ser vale como bem-aventurado o bastante para justificar ainda uma imensidão de sofrimento. – O homem trágico afirma o mais acre sofrimento: é forte, pleno, divinizante o bastante para tanto. – O cristão nega até a sorte mais feliz sobre a Terra: é fraco, pobre, deserdado o bastante para sofrer de toda forma na vida... ‘o Deus na cruz’ é uma maldição sobre a vida, um dedo indicador para libertar-se dela; - o Dionisos posto em pedaços é uma promessa para a vida: saindo da destruição, ele voltará sempre ao lar, renascido.”3
Também, sem entrar aqui na intrincada discussão sobre o papel e o significado do coro da tragédia grega, as “Mulheres da Cozinha”, tal como são representadas na novela, como uma espécie de “coro de sátiros”, e pelas funções que cumprem, de comentadoras agourentas de várias passagens, entre elas as cenas que acompanham as agonias do Chefe Zequiel, e pelo tema que desenvolvem nos comentários, o do movimento implacável da vida e a busca mágica de sua contenção, parecem corresponder bem a uma das partes, a mais positiva, que Nietzsche atribuía ao coro da tragédia grega, no livro O Nascimento da Tragédia: “Da mesma maneira, creio, o grego civilizado sentia-se suprimido perante o coro dos sátiros: e esse é o efeito mais próximo da tragédia dionisíaca, o fato de o Estado e a sociedade, e em geral as clivagens entre um ser humano e outro, darem lugar a um poderosíssimo sentimento de unidade, que tudo reconduz ao coração da natureza. A consolação metafísica – com a qual, como aqui já sugeri, cada tragédia verdadeira se despede de nós –, segundo a qual a vida, no fundamento das coisas e apesar de toda a mutação dos fenômenos, é indestrutivelmente poderosa e plena de prazer, tal consolação surge em carnal nitidez sob a forma de coro de sátiros, coro de seres naturais que vivem por assim dizer por detrás de toda a civilização, permanecendo inextinguíveis e sempre os mesmos, mau grado toda a mutação das gerações e da história dos povos”. 4
Após o final noturno da novela, carregado de duplicidades, de anúncios de vida e morte, com a efetivação do encontro entre Lalinha e iô Liodoro, o autor introduz um outro final, diurno, com a chegada de Miguel ao Buriti Bom, em pleno dia, seccionado pelos asteriscos, mas como se fossem ambos as pontas reunidas do mesmo círculo. Só que agora o sentido de seu movimento é fixado não como o de vida e morte, mas como o de morte e vida, noite e dia, anunciando este o ressurgimento e a esperança. Com isso, ele nos afirma cada vez mais o balanço cíclico do Eterno Retorno, de Nietzsche, esse movimento profundo que arrasta atrás de si também a história, como está num outro fragmento de A Vontade de Poder: “Com a palavra ‘dionisíaco’ é expresso: um ímpeto à unidade, um remanejamento radical sobre pessoa, cotidiano, sociedade, realidade, sobre o abismo do parecer: o passionalmente doloroso transporte para estados mais escuros, mais plenos, mais oscilantes; o embevecido dizer-sim ao caráter global da vida como que, em toda mudança, é igual, de igual potência, de igual ventura; a grande participação panteísta em alegria e sofrimento, que aprova e santifica até mesmo as mais terríveis e problemáticas propriedades da vida; a eterna vontade de geração, de fecundidade, de retorno; o sentimento da unidade da necessidade do criar e do aniquilar.”5
Numa cena orgiástica, próxima do final da novela, da qual participam Glorinha e nhô Gualberto Gaspar, iô Liodoro e Lalinha, formando dois casais impossíveis, pelos francos impedimentos, morais e estéticos, que se interpunham entre eles, ficamos próximos daquilo que Nietzsche considerou como “a arte trágica” e da sua linguagem simbólica, no livro La Vision Dionysiaque du Monde: “Apolo e Dioniso se fundiram. Já que o elemento dionisíaco se infiltrou na vida apolínea, e que de acréscimo a aparência fixou-se como limite, a arte trágico-dionisíaca não tem mais valor de ‘verdade’. Seus cantos e suas danças não são mais uma embriaguez instintiva da natureza: a massa exaltada do coro dionisíaco não é mais essa multidão popular tomada pela pulsão primaveril. A partir de agora, a verdade é simbolizada, ela se serve da aparência, ela pode e deve também na sua finalidade empregar as artes da aparência. Mas uma grande diferença aparece já com relação à arte anterior, naquilo que os meios artísticos da aparência são em seu conjunto chamados em socorro, para que as estátuas se coloquem assim em marcha, que as pinturas das ações periféricas [périactes] se desloquem, o mesmo cenário exigindo do olhar que ele seja ora diante de um templo, ora diante de um palácio. Assim, constatamos uma certa indiferença frente à aparência, que deve nesse momento abandonar as eternas prerrogativas e as suas exigências soberanas. A aparência não é mais absolutamente percebida como aparência, mas como símbolo, como signo da verdade. De onde a fusão – escandalosa em si – dos meios da arte. O emblema mais manifesto desse desprezo da aparência, é a máscara. Ao espectador é então ditada a exigência dionisíaca de se representar todas as coisas sob o sortilégio do encantamento, de não ver jamais mais do que o símbolo, de considerar que o mundo inteiro visível da cena e da orquestra é o império do milagre. Entretanto, onde está o poder que transporta na tonalidade de uma alma que cresce aos milagres, e pela qual ele vê o encantamento de todas as coisas? Quem possui o poder da aparência e conduz sua força ao plano do símbolo?/ É a música.”6
O primeiro final da novela foi o do encontro noturno de Lalinha com iô Liodoro, um encontro de despedida e morte, pelo menos dos laços de parentesco entre os dois, das suas condições de nora e sogro. Depois dos asteriscos, temos o segundo final, agora diurno e radioso. Ele, de certo modo, reproduz os finais gloriosos anunciados pelos cantos dos pássaros que sucediam a cada uma das paisagens acústicas noturnas tenebrosas vividas pelo Chefe Zequiel. O retorno de Miguel ao Buriti Bom é na verdade não um final, mas um recomeço carregado de esperanças, como a promessa de formação de uma nova família, com fundas raízes na tradição patriarcal, nas de iô Liodoro. Ele vinha de jeep, como moço da cidade, veterinário; era a chegada do moderno, “esses progressos”, como dizia nhô Gualberto Gaspar, não para negar, mas para renovar a tradição. O casamento de Miguel com Glória reintegraria e completaria o destino de um menino que se desgarrara com a desintegração da frágil família patriarcal do Mutum, que não prosperara, ocorrida logo na primeira estória do livro, Campo Geral. E fundaria uma nova família que salvaria o Buriti Bom, tanto de suas ameaças externas, como nhô Gualberto e a Grumixã, como das internas, os destinos dos dois irmãos, amigados com ex-prostitutas, e de Maria Behú (que encarnava o próprio espírito do cristianismo, de negação, de dizer não à vida), solteirona e agora morta, que poderiam levá-lo à extinção. Com isso, se completaria a dança do Corpo de Baile, essa dança cíclica do eterno retorno que arrastava consigo a história, com um fim que era um começo, e se fecharia o círculo da primeira epígrafe do livro, de Plotino. Era uma bela imagem simbólica que procurava reunir e não opor a permanência com a mudança, e reproduzia o disegno interno ordenador da novela: a vivência das várias estórias de amor girando em torno do Buriti-Grande, a árvore axial totêmica. Assim como essa figuração se ajustava inteiramente à sua interpretação atualizada e trabalhada como um dos seus temas centrais, o da relação do mito com a história, do mito grego do dionisismo com a sua vigência transitória no sertão do Brasil: “Num círculo, o centro é naturalmente imóvel; mas, se a circunferência também o fosse, não seria ela senão um centro imenso.” Por isso, a última palavra dessa estória noturna é “dia”, numa frase formada só pelo complemento, sem sujeito nem verbo: “Diante do dia”. O quê, senão o recomeço?
O que me levou a refletir sobre essa idéia nietzscheana de história – uma reação à filosofia da história hegeliana e à visão positivista da história –, trabalhada na novela (e no livro) foram dois fragmentos de Walter Benjamin a respeito do assunto, que estão, não nas suas impressionantes e inquietantes “Teses de filosofia da história”, mas no livro fundamental para o conhecimento da civilização e mentalidade burguesas, Passagens, e que, de certa forma, realiza o que ele próprio teria por um “conceito dialético do tempo histórico”. Como esse mito do eterno retorno tem sido muito usado para a leitura da história do Brasil, em nome da dialética, acho útil ter sempre em vista estes dois comentários de Walter Benjamin sobre ele, com os quais concordo inteiramente: “A essência do acontecimento mítico é o retorno. Nele está inscrita, como figura secreta, a inutilidade gravada na testa de alguns heróis dos infernos (Tântalo, Sísifo ou as Danaides). Retomando o pensamento do eterno retorno no século XIX, Nietzsche assume o papel daquele em quem se consuma de novo a fatalidade mítica. (A eternidade das penas infernais [com o cristianismo] talvez tenha privado a idéia antiga do eterno retorno de sua ponta mais terrível. A eternidade de um ciclo sideral é substituída pela eternidade dos sofrimentos [no caso, no inferno cristão]).” / “A crença no progresso, em sua infinita perfectibilidade – uma tarefa infinita da moral –, e a representação do eterno retorno são complementares. São as antinomias indissolúveis a partir das quais deve ser desenvolvido o conceito dialético do tempo histórico. Diante disso, a idéia do eterno retorno aparece como o ‘racionalismo raso’, que a crença no progresso tem a má fama de representar, sendo que esta crença pertence à maneira de pensar mítica tanto quanto a representação do eterno retorno.”7 (Benjamin, 2006, p. 159, grifo meu)
Creio que seja a partir daqui, da recusa à crença positivista e à recuperação da concepção mítica da história, mesmo que agora fundamentada na ciência biológica, que surgem algumas perspectivas de estudo: 1o) Como o livro de Walter Benjamin, Passagens, realiza no plano da narrativa histórica (como uma forma de apreensão e “representação” do tempo) esse “conceito dialético de tempo histórico”? 2) Como o aproveitamento das formulações nietzscheanas do eterno retorno e do dionisismo, como faz Guimarães Rosa, para a critica à visão positivista e historicista da história, dominante no país na época da escrita de Corpo de Baile, década de 50, anos do nacional-desenvolvimentismo, e numa obra ficcional, poderia contribuir para a formulação de uma visão mais realista da história do Brasil.


1 Cf. Luiz Roncari, O Brasil de Rosa, São Paulo, Editora UNESP, 2004, pp. 151, em especial p. 152, nota 63
2 Nietzsche, O Nascimento da Tragédia, trad. De Helga Hoock Quadrado, Lisboa: Relógio D’Água Editores, 1997, pp. 117-119
3 Nietzsche, A Vontade de Poder, trad. de Marcos Sinésio Pereira Fernandes e Francisco Dias Moraes, Rio de Janeiro: Contraponto, 2008, par. 1052, pp. 504 e 505
4 Nietzsche, O Nascimento da Tragédia, p. 58, grifo meu
5 Nietzsche, “O eterno retorno”, in Nietzsche, trad. de Rubens Rodrigues Torres Filho, São Paulo: Editor Victor Civita, 1983, par. 1050, p. 393
6 Nietzsche, La Vision Dionisiaque du Monde, trad. de Lionel Duvoy, Paris: Éditions Allia, 2007, pp. 54 e 55, trad. minha
7 Walter Benjamin, Passagens, trad. de Irene Aron e Cleonice Paes Barreto Mourão, Belo Horizonte/São Paulo: Editora UFMG/Imprensa Oficial do Estado, 2006, p. 159
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